“À utopia da gramática – quer dizer, a uma concepção da linguagem que ignora todo lugar, geográfico ou histórico, norte e sul, antiguidade e modernidade, em sua vontade de universalidade – a linguística de Rousseau opõe uma topologia que procura sobretudo as diferenças de lugar, no espaço e no tempo, mas também no interior de uma mesma sociedade [...]. À lógica que atravessa a linguagem em direção à universalidade do entendimento, Rousseau opõe uma espécie de estilística que enquadra a verdade da linguagem no sistema das diferenças locais e históricas, num pluralismo de linguagens qualitativamente diferentes.” Rousseau expressa seu pensamento de modos diversos, adequando o estilo a leitores específicos: vai das ciências à autobiografia, passando pela filosofia e pelo direito, com lugar ainda para o romance, o teatro e a música. Tal multiplicidade, alguns alegam, sinaliza incoerência. A unidade de sua obra é, nesse sentido, um problema de primeira importância para os comentadores sistemáticos. O exame da recepção dos escritos de Rousseau constitui o pano de fundo perante o qual Bento Prado Júnior apresenta sua tese sobre os auditórios: a unidade do pensamento – ou da teoria – infere-se da tipologia dos sujeitos discursivos, quer no interior da própria obra (seja esta coerente ou não), quer na trama entre o autor e seu público.
Bento Prado Júnior (1937-2007) lecionou filosofia na Universidade de São Paulo até ser aposentado compulsoriamente pela ditadura militar, em 1969. Exilou-se, então, na França, de onde só retornaria no final da década de 1970, quando começou a dar aulas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, mais tarde, na Universidade Federal de São Carlos, onde trabalhou até o ano de seu falecimento.
Bertrand Russell (1872-1970) descobriu a matemática aos onze anos. Foi, como posteriormente registrou, uma experiência arrebatadora: "tão inebriante quanto o primeiro amor". A partir daquele momento, seguiria sua paixão com devoção inquebrantável e fervor quase erótico. A matemática poderia vencer onde a filosofia havia falhado, reduzindo o pensamento à sua forma mais pura e libertando o conhecimento da dúvida e contradição. E assim, por algum tempo, pareceu ser. As investigações matemáticas de Russell resolveram sem esforço, de uma só vez, alguns dos mais intratáveis problemas da filosofia. No entanto, se a matemática pode ser uma fonte de liberação, é, também, fonte inconfiável... Analisando o trabalho daquele que é indiscutivelmente um dos gigantes de nossa época, o livro extremamente claro e bem escrito de Ray Monk também nos conta uma história humana: uma tocante história de amor e perda, de extasiante triunfo e profunda desilusão.
Livro que procura discutir parte da obra de Guimarães Rosa como sendo a de um intérprete do Brasil, de forma peculiar (como afirma o autor) que, nos seus três primeiros livros, apreciou os costumes da vida pública junto aos da vida privada, os familiares e amorosos, próprios do romance. Demonstra como as três obras iniciais de Rosa, Sagarana, Corpo de baile e Grande sertão: veredas, se relacionam e se imbricam, podendo as duas primeiras ser consideradas como estudos preparatórios para Grande sertão. Nessa perspectiva, o autor investiga a genealogia e a formação do herói jagunço; a gestação dos paradigmas amorosos de Grande sertão, já incubados em Sagarana e desenvolvidos num dos romances de Corpo de baile; e a teatralização do drama civilizatório no Brasil.
No panorama contemporâneo, talvez nenhum criador possa igualar-se à importância teórica de Henri Pousseur. Em que pese o fato de que alguns dos conceitos mais importantes para o embasamento de suas teorias e de sua prática compositiva não sejam sempre exclusivos de seu pensamento, noções como polarização, omnipolaridade ou multipolaridade, direcionalidade, projeções e redes harmônicas, citação musical como recurso metalinguístico, periodicidade e aperiodocidade, diagonalidade harmônica, sobredeterminação, entidades harmônicas, entre muitos outros, seriam impensáveis, no amplo espectro de suas significações, sem os escritos de Pousseur.
A arte de roubar, obra contextualizada na Espanha oitocentista, traz um estudo sobre a arte do embuste, ou, como diz seu título alternativo, um “manual para não ser roubado”. Ora tendendo ao ensaio, ora ao texto narrativo, o livro apresenta uma bem-humorada crônica de costumes que surpreende por sua argúcia cortante e atualidade.
"O Sobrinho de Rameau", obra que fascinou Goethe, Hegel, Engels e Freud, alcançando um status literário-filosófico de destaque na obra de Diderot, representa com maestria o ambiente cultural da Paris do começo da segunda metade do século XVIII. Em clave ágil e irônica, traz à luz discussões filosóficas caras aos iluministas e incrementa com sutileza o embate intelectual característico da época. Sempre preservando o esmero estilístico, estrutura-se assim uma resposta ampla dos enciclopedistas a seus detratores.