Os textos clássicos de Maurício Tragtenberg que estavam esgotados, Burocracia e ideologia – 2ª edição e Administração, poder e ideologia – 3ª edição, acabam de chegar da gráfica de nova impressão.
Em Burocracia e Ideologia, Tragtenberg promove uma crítica sobre a Teoria Geral da Administração em seu processo de constituição histórica, neste que é um de seus trabalhos mais discutidos. Ele esmiúça a burocracia no universo corporativo contemporâneo dominado pela racionalização do trabalho, o messianismo administrativo, a educação permanente e a tecnoburocracia. Chega, assim, à formulação da administração de empresas como uma expressão do poder.
O autor realiza uma exposição criteriosa das idéias de Frederick Taylor, Henri Fayol e Elton Mayo. O taylorismo é visto como uma transposição para o campo da administração de uma ética da obediência, que corresponde às primeiras etapas do desenvolvimento do capitalismo. Fayol surge para dar prosseguimento aos princípios de Taylor e fundamentar uma concepção de unidade de comando administrativa. Já o pensamento de Mayo funciona como resposta intelectual à concentração de capital.
Porém, uma das grandes contribuições da obra está na apresentação meticulosa das idéias de Max Weber. Ao contrário da visão positivista freqüente assumida pela maioria dos críticos, Tragtenberg nos apresenta a sociologia weberiana como “a vivência de valores liberais numa época em que o liberalismo atravessa uma crise moral”. Weber, embora apegado aos valores racionalistas e liberais de uma época feliz da burguesia européia, não deixava de expressar a crise que afetava o liberalismo alemão no início do século passado. Até certo ponto, os dilemas de Max Weber são os de todos os intelectuais democráticos da atualidade.
Já Administração, poder e ideologia não constitui apenas uma demonstração da capacidade de Tragtenberg de pensar o mundo contemporâneo de forma lúcida e clara. O quadro que faz da internacionalização da economia e da transformação das corporações em entidades organizadas como Estado continua a nos oferecer uma base sólida a partir da qual podemos apreender o sentido das relações trabalhista na constituição do mundo contemporâneo.
Tragtenberg analisa a internacionalização da economia e seu impacto no campo de ação dos Estados nacionais. Investiga detalhadamente o conceito de co-gestão e as relações hierárquicas das estruturas corporativas, dissecando a teoria participativa que ainda hoje é um paradigma administrativo. Reflete sobre a degradação do trabalho que hoje se verifica em escala global e o faz com estudos empíricos que abarcam a Europa, o Brasil, a Argentina e a Bolívia.
O resultado deste percurso é um retrato da grande corporação e de seus executivos, da supressão do indivíduo na rotina do trabalho e da exploração dos trabalhadores no mundo todo. Entende a contradição que dilacera esta corporação – “o contraste entre a sua natureza privada e seu alcance social” – e expõe toda a carga ideológica presente na nova ordem social, mostrando como o “novo capitalismo” desmonta o sistema de contrapesos do liberalismo ao substituir o materialismo da propriedade e as máquinas por certificados de ações.