Reunião de escritos do filósofo iluminista revela consistência de suas posições sobre o consumo de carne e o tratamento cruel dispensado aos animais, “nossos semelhantes”
“A ideia do bem e do mal só é possível se a estabelecermos em relação a nós. Os sofrimentos de um animal nos parecem ruins, porque, sendo animais como eles, protestaríamos muito se nos fizessem a mesma coisa”, escreve o filósofo iluminista Voltaire num de seus muitos textos sobre o não consumo de carne e o sofrimento causado aos animais. Este material, disperso e alusivo, chega agora reunido, em língua portuguesa, na obra Pensamentos vegetarianos, novo título da Coleção Pequenos Frascos, da Editora Unesp.
“Voltaire começa a se interessar pela questão vegetariana por volta de 1761”, anota o responsável pelo estabelecimento da edição, notas e posfácio do livro, Renan Larue. “Esse interesse tardio – ele tinha 68 anos nessa época – parece estar ligado às diversas leituras que fazia quase ao mesmo tempo: o testamento de Jean Meslier, Emílio de Rousseau, vários livros sobre o hinduísmo e principalmente o Tratado da abstinência (de carne) de Porfírio, ou Tratado de Porfírio sobre a abstinência de carne dos animais, que fora recentemente traduzido do grego para o francês (1747). A partir de 1762, o tema vegetarianismo aparece regularmente na obra de Voltaire, porém de modo disperso e alusivo. No entanto, o filósofo dedica vários trechos extensos à matança, à carne, aos animais e aos seus sofrimentos. São esses textos que estão aqui reunidos.”
Ao longo de dez capítulos, num livro curto – pouco mais de cem páginas – mas intenso e profundo, Voltaire aborda os diversos ângulos da questão vegetariana. “Há algo mais abominável do que alimentar-se continuamente de cadáveres?”, pergunta-se, em determinado momento. Em outro, quando inclui um verbete em seu dicionário sobre os animais, lamenta-se: “Que dó, que pobreza, ter dito que os animais são máquinas privadas de conhecimento e de sentimento, que agem sempre da mesma maneira, que nada aprendem, nem se aprimoram etc.” A crítica é direcionada, sobretudo, à visão de Descartes, sobre os animais-máquina, expressa em Discurso do método.
“Em suas obras, Voltaire mostra-se advogado do vegetarianismo: a leitura do ‘É preciso tomar partido’, por exemplo, ou de alguns trechos de ‘A princesa da Babilônia’ não dá margem a dúvida”, prossegue Larue. “O filósofo recusa mais ainda o carnismo, essa antiga ideologia que não se identifica e segundo a qual Deus, ou a natureza, ou o direito do mais forte, permitiria à espécie humana matar os membros das outras espécies e comer sua carne. Para legitimar seus hábitos alimentares, os carnívoros estão persuadidos que os animais foram feitos desde sempre para serem devorados pelos homens, que eles não têm alma espiritual, são incapazes de raciocínio e que não sofrem verdadeiramente quando são maltratados. Voltaire recusa firmemente cada uma dessas afirmações.” Em tempos de discussões sobre crueldade animal e impacto da pecuária para o meio ambiente, a leitura se revela atualíssima.
Sobre o autor – François-Marie Arouet (1694-1778), mais conhecido pelo pseudônimo Voltaire, foi um escritor, ensaísta, deísta e filósofo iluminista francês.
Sobre o organizador - Renan Larue é um escritor francês, estudioso da literatura e historiador do vegetarianismo. É autor de vários livros sobre vegetarianismo ou veganismo. Atualmente, é professor associado de literatura francesa, na Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara.
Título: Pensamentos vegetarianos
Autor: Voltaire
Estabelecimento da edição, notas e posfácio: Renan Larue
Tradução: Constancia Egrejas
Número de páginas: 102
Formato: 11,5 x 18 cm
Preço: R$ 54,00
ISBN: 978-65-5711-027-0