A Revolução Chinesa, em 1949, ampliou o bloco socialista e forneceu novos modelos para revolucionários em várias partes do mundo. Com a participação da China em instituições até recentemente controladas pelos países capitalistas, talvez seja possível dar início a uma reavaliação mais serena dos acontecimentos. Essa Revolução que intriga o Ocidente e as reformas promovidas pelo regime a partir de fins do século XX impõem a tarefa sempre renovada de esclarecer o perfil e os rumos dessa epopeia ainda não terminada.
Wladimir Pomar é jornalista e escritor brasileiro. Autor de diversos estudos e livros sobre a China e também de uma trilogia sobre a teoria e a prática das tentativas de construção do socialismo, ao longo do século 20.
Segundo as palavras de Salvador Allende: “milhões de pessoas no mundo querem o socialismo, mas não querem ter de enfrentar a tragédia da guerra civil para consegui-lo”. A resposta do próprio Allende e do povo chileno a esse anseio foi consubstanciada pela experiência democrática socialista inaugurada em 1971. Jornada ainda hoje paradigmática na evidenciação dos limites da democracia liberal, os três conturbados anos do governo liderado pela Unidade Popular, levaram à tragédia épica de setembro de 1973 e à subsequente violência e ao obscurantismo da ditadura militar. Esta jornada heroica, mas frustrada, alerta para as dificuldades e complexidades com que se defronta a concretização conjunta dos ideais clássicos da liberdade e da justiça social igualitária.
Por mais de cinquenta anos, a trajetoria da experiência revolucionária em Cuba abrigou personalidades marcantes, como Che Guevara, e acontecimentos dramáticos, como a Crise dos Mísseis. Todos esses icones históricos do século XX entrecruzam-se com a profunda reestruturação interna da economia e sociedade cubanas e o associado desafio à antes incontrastada hegemonia dos Estados Unidos sobre a América Latina. A complexidade desses elementos não deve ser menosprezada e, em si, é uma explicação para as paixões e a batalha interpretativa ainda hoje evocadas por essa evolução caribenha.
A Coreia do Norte é comumente retratada no Ocidente de forma caricatural. Difunde-se a imagem de um regime fechado, à beira do colapso, irracional, que oprime um povo faminto enquanto investe fortunas em um projeto nuclear megalomaníaco. Perdem-se, nessas representações caricatas e eivadas de objetivos políticos, tanto o contato com a real configuração do regime norte-coreano, de impressionantes conquistas socioeconômicas, quanto as complexidades que caracterizaram todo o processo revolucionário e continuam a tensionar o sudeste asiático.
A Revolução no México e suas figuras exponenciais, como Emiliano Zapata, têm destaque no imaginário popular. Sua longevidade e a popularidade de seus ideais expõem circunstâncias históricas distintivas que definem a trajetória do país desde finais do século XIX. Mas a pujança dos anseios igualitários que se entrelaçavam com esses movimentos transcende fronteiras e ainda hoje inspira o mundo. Tão viva quanto a memória revolucionária mexicana é o reconhecimento de sua relevância e complexidade e a intensa disputa interpretativa que enseja.
Em uma região conturbasda desde tempos imemoriais, o Irã da segunda metade do século XX honra a tradição e abriga situação explosiva: uma monarquia, autointitulada herdeira dos vetustos imperadores persas, debate-se, espremida entre a autocracia, a corrupção e os anseios modernizadores. Completando o quadro dramático, a presença crescente do fundamentalismo islâmico e a não disfarçada intervenção das potências ocidentais – sempre obcecadas pelas enormes reservas petrolíferas do país – acarretam a tensão geopolítica prenunciadora de típicos cenários contemporâneos. A "revolução dos aiatolás" é, assim, exemplar. Mais do que conflito localizado, é fruto das variáveis definidoras de nossa época e expõe os perigos e os desafios que enfrentamos.