Estudos colaboram para aprofundar aspectos múltiplos e complexos da escravidão de mulheres no processo de emancipação, tanto no Brasil como em outras sociedades escravistas atlânticas
Em 28 de setembro de 1871, era assinada a Lei do Ventre Livre, que passava a considerar livres todos os filhos de mulheres escravizadas nascidos a partir de então. A lei, que vinha colocar fim ao uso do ventre das mulheres como local de reprodução da escravidão, não impediu, entretanto, que uma série de atrocidades continuasse ocorrendo na vida dessas mulheres e de seus filhos, fossem elas violências físicas, sexuais, psicológicas, simbólicas ou afetivas. Em busca de examinar esses desdobramentos nasce o livro Ventres livres? Gênero, maternidade e legislação, organizado pelos pesquisadores Maria Helena P. T. Machado, Luciana da Cruz Brito, Iamara da Silva Viana e Flávio dos Santos Gomes, lançamento da Editora Unesp.
A obra reúne 24 artigos de importantes historiadores e historiadoras do Brasil e do exterior. “O objetivo do livro é explorar, pela perspectiva do gênero, da raça e da liberdade, aspectos múltiplos e complexos da escravidão de mulheres no processo de emancipação, tanto no Brasil como em outras sociedades escravistas atlânticas, centrando especialmente nossa problemática em questões vinculadas às violências da escravidão e às resistências apresentadas por essas mulheres”, pontuam os organizadores na introdução da obra. “Dessa forma, pretende-se enfocar temas sensíveis como exploração da sexualidade, estupro, filiação, bastardia, feminicídio e infanticídio, bem como suas respostas na forma de resistências, que se desdobravam em formas múltiplas e criativas de organização da sobrevivência física, familiar, social e comunitária.”
A coletânea se divide em cinco partes – diferentes, mas articuladas. A primeira discute questões de gênero e violência na escravidão e depois da abolição; a segunda fala dos ventres livres sob uma perspectiva de outras sociedades atlânticas; a terceira traz o papel da família na aquisição da liberdade; a quarta trata das narrativas e resistências; a quinta e última fecha a coletânea abordando as dimensões educativas e tutelares presentes nas estratégias de controle do trabalho e do acesso à educação.
“Ao nos aproximarmos dos 150 anos da promulgação da Lei do Ventre Livre, que ocorre neste ano de 2021, cabe-nos, como historiadores e historiadoras dos temas da escravidão, emancipação e pós-abolição, lançar o desafio de refletir, para além dos resultados diretos da lei, sobre os impactos desse instituto jurídico nas diferentes modalidades de violência física, sexual, psicológica, simbólica e afetiva que recaíam especificamente sobre a mulher escravizada e sua prole”, anotam os organizadores. “Desde seus primórdios, a escravidão nas Américas abraçou como princípio fundamental o partus sequitur ventrem, estabelecendo o ventre como o próprio lócus da escravidão. Ao contrário do princípio patriarcal que regia as sociedades senhoriais atlânticas, no âmbito da escravidão, era a condição materna – ou do ventre – que definia o cativeiro da prole. Com tudo isso, e com nada menos que isso, Ventres Livres? deixa seu recado: o da centralidade da mulher negra – africana e afrodescendente – na superação da escravidão e na construção de um mundo possível no pós-abolição.”
Sobre os organizadores
Maria Helena Pereira Toledo Machado é professora titular no Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora produtividade 1B do CNPq. Graduada em História pela USP (1979), mestre (1985) e doutora (1991) em História Social, também pela USP. Foi professora visitante na Univerity of Michigan (Ann Arbor) e Visiting Fellow na Harvard University.
Luciana da Cruz Brito é professora do curso de História da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e do mestrado em História da África, da Diáspora e dos Povos Indígenas na mesma universidade. Doutora em História Social pela USP, foi pesquisadora visitante no Instituto Du Bois da Harvard University e bolsista Fulbright na New York University, onde completou seu doutorado sanduíche.
Iamara da Silva Viana é professora do Departamento de História da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) professora adjunta do Departamento de Estudos Aplicados ao Ensino da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Deae-Uerj) e professora do Programa de Pós-Graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC-UFRJ). Tem bacharelado e licenciatura em História pela UFRJ (2004), mestrado em História Social pela Uerj (2009) e doutorado em História Política pela Uerj – com estágio na École des Hautes Études em Sciences Sociales (Ehess), Paris (2016).
Flávio Gomes é professor associado do setor de História do Brasil, no Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutor em História Social pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp, 1997). Foi professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) de 1994 a 1998. Em 2009 obteve a John Simon Guggenheim Foundation Fellowship. Realizou estágio de pós-doutorado na Universidade de São Paulo (USP) (2006); Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC, 2012-2013); e foi pesquisador visitante na New York University (2014) e professor visitante na USP (2019).
Título: Ventres livres? Gênero, maternidade e legislação
Organizadores: Maria Helena P. T. Machado, Luciana da Cruz Brito, Iamara da Silva Viana e Flávio dos Santos Gomes
Número de páginas: 592
Formato: 16 x 23 cm
Preço: R$ 89,00
ISBN: 978-65-5711-068-3
Debate entre os organizadores da obra, com lançamento e sorteio do livro
Terça-feira, 28 de setembro, às 19h
Transmissão simultânea nos canais do Facebook e YouTube da Editora Unesp, Anpuh-BA, Anpuh-RJ e GT Emancipações & Pós-Abolição
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