Com a mudança de paradigmas estéticos, a memória poética de muitos foi sacrificada, incluída aí Francisca Júlia da Silva, figura central do parnasianismo e simbolismo brasileiro
Figura então central do parnasianismo e simbolismo brasileiro, a poetisa Francisca Júlia da Silva (1871-1920) morreu duas vezes: a primeira, ao tirar a própria vida aos 49 anos, meses antes da grande onda modernista que varreu o Brasil e viria a tomar forma na Semana de Arte Moderna de 1922; e sua segunda morte, pode-se assim dizer, decorreu justamente dessa mudança de paradigmas estéticos, que sacrificou injustamente a memória de tantos para dar lugar às novas formas de pensar. É como forma de recuperar a memória da poetisa que o sociólogo José de Souza Martins traz a lume As duas mortes de Francisca Júlia: A Semana antes da Semana, lançamento da Editora Unesp.
“Este livro foi em grande parte motivado por meu desconforto de sociólogo em face das muitas simplificações e omissões em várias biografias sumárias da reconhecidamente grande poetisa brasileira Francisca Júlia da Silva”, anota José de Souza Martins. “A narrativa mais comum da história pessoal de Francisca Júlia decorre de pesquisas compreensivelmente incompletas em documentação dispersa e fragmentária. Procurei dar à minha investigação maior amplitude, alargando o elenco de fontes e valorizando sociologicamente dados e referências cuja relevância não é reconhecida em estudos estritamente centrados na obra literária da poetisa. Especialmente no que diz respeito à trajetória de seu pai e à poesia de seu irmão, Júlio César da Silva, cujas biografia e obra são essenciais para a compreensão da história e da obra da irmã.”
A biografia dessa poeta maiúscula é estratégica para a exposição do meio social, cultural e artístico que prenunciava a Semana e definiria o panorama nacional subsequente. Mais do que o retrato de uma vida trágica, eivada de adversidades pessoais e sociais, procura-se aqui fazer justiça a uma trajetória que expõe a condição limitante da mulher literata de então, em paralelo com a sofisticação gradualmente conquistada pela cidade que a abrigava. “Sua história verdadeira é a da mulher discriminada e, contraditoriamente, admirada”, reforça Martins. “É, também, a história peculiar da inserção vacilante da mulher interiorana no mundo da grande cultura em esboço na cidade de São Paulo, que deixava de ser caipira e simples para se tornar, rapidamente, a cidade brasileira rica e culta da virada do século XIX para o século XX”.
Sobre o autor
José de Souza Martins é sociólogo. Professor Titular aposentado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, da qual se tornou Professor Emérito em 2008. Foi professor visitante da Universidade da Flórida (EUA) e da Universidade de Lisboa, havendo sido eleito professor da Cátedra Simón Bolívar da Universidade de Cambridge e fellow de Trinity Hall (1993-1994). Autor de mais de duas dezenas de obras, publicou, pela Editora Unesp, em 2021, Sociologia do desconhecimento: ensaios sobre a incerteza do instante; antes, em 2017, em coedição com a Imprensa Oficial, o livro de crônicas O coração da Pauliceia ainda bate, menção honrosa no Prêmio Abeu e finalista do Jabuti. Em 2015, foi eleito para a Cadeira no 22 da Academia Paulista de Letras.
Título: As duas mortes de Francisca Júlia: A Semana antes da Semana
Autor: José de Souza Martins
Número de páginas: 306
Formato: 14 x 21 cm
Preço: R$ 58
ISBN: 9786557111444