Romance símbolo do pré-modernismo brasileiro, Triste fim de Policarpo Quaresma
marca estreia da Coleção Clássicos da Literatura Unesp
Não são poucos os motivos que dão a Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1922) um lugar muito especial dentro da cena literária do país. Filho de família pobre, neto de avós negras que sofreram o período da escravidão, decidiu se arriscar em um ofício usualmente restrito à elite intelectual branca, e teve uma produção prolífica, que lhe deu o reconhecimento da posteridade. Dentre os trabalhos mais saudados, destaca-se Triste fim de Policarpo Quaresma, considerada a obra que efetivamente o lançou ao rol dos grandes da literatura do Brasil e que ora ganha nova edição pela Coleção Clássicos da Literatura Unesp. Publicada pela primeira vez em 1911, como folhetim nas páginas do Jornal do Commercio, sua compilação em formato livro aconteceu em 1915, financiada pelo próprio autor.
Lima Barreto tornou-se um autor de rotulagem complexa, o que se deve às várias possibilidades de assimilação e análise que abre a leitores e à academia: ora visto como escritor virtuoso, de grandes recursos estéticos, ora como popular, voltado à abordagem de temas da realidade que o cercava. Fato universalmente reconhecido é que soube caracterizar aguçadamente a sociedade brasileira, em especial a carioca, do fim do século XIX, combinando crônica de costumes com crítica social, engajamento político com fina ironia.
Em Triste fim de Policarpo Quaresma, acompanhamos a saga do anti-herói Policarpo Quaresma, chamado de major, embora não o seja. Homem de grande dignidade e valores inquebrantáveis, é um ufanista por convicção: vê superioridade brasileira em qualquer tipo de comparação que se faça com estrangeiros. Não hesita em trocar vermute importado por parati oriundo de nossos alambiques.
Não surpreende, portanto, que ele reivindique a ideia de fazer do tupi-guarani o idioma oficial do Brasil, sob o insólito argumento de que o português seria uma “língua emprestada”. Formulado tal pedido em uma petição às autoridades competentes, Quaresma se torna alvo de escárnio generalizado. Vai para o campo, onde seu otimismo nacionalista passará a mirar a agricultura. A realidade, porém, trai com frequência suas utopias mais entranhadas. Vemos então o retorno do personagem ao meio urbano, quando um cenário de instabilidade social e política o levará a se tornar, agora sim, um major de fato, e a necessidade de agir militarmente testará sua consciência de bom samaritano.
O romance sintetiza muitas “questões terceiro-mundistas” que caracterizam toda a produção de Lima Barreto. A postura patriota de Quaresma soa tão antinatural à maioria de seus conterrâneos que lhe será designada uma internação em sanatório. Pode-se dizer que Lima Barreto – que, aliás, conheceu na pele esse tipo de instituição, internado por seus problemas com alcoolismo e depressão –, foi um visionário: passados mais de cem anos da escrita de Triste fim, suas ideias mantêm uma terrível atualidade. Tendo morrido na pobreza, o que não deixa de ser simbólico de sua própria jornada em vida e dos temas que abordou em seus escritos, Lima Barreto, ao menos, não caiu no ostracismo. Alvo de uma primeira onda de redescoberta na década de 1950, permanece desde então como referência obrigatória para gerações de leitores que não se cansam de apreciá-lo.
Sobre a coleção - Clássicos da Literatura Unesp constitui uma porta de entrada para o cânon da literatura universal. Não se pretende disponibilizar edições críticas, mas simplesmente volumes que permitam o deleite dos grandes textos que marcaram a humanidade. A seleção de títulos é conscientemente multifacetada e não sistemática, permitindo o livre passeio do leitor. Já estão publicados outros quatro títulos: A relíquia, de Eça de Queirós, Contos, de Guy de Maupassant, Histórias extraordinárias, de Edgar Allan Poe, e Quincas Borba, de Machado de Assis.
Título: Triste fim de Policarpo Quaresma
Autor: Lima Barreto
Número de páginas: 248
Formato: 13,4 x 20,2 cm
Preço: R$ 48,00
ISBN: 978-85-393-0836-1