Ao se debruçar sobre esses conceitos, o pensador engendra etapa fundamental de seu empreendimento científico: uma antropologia positiva das sociedades ocidentais
Devemos destruir todas as obras de nossas mãos para permanecermos frios como mármore, ou nos deixar dominar por nossas próprias criaturas? Escolher o fetichismo ou optar pela iconoclastia? É diante destas perguntas que se coloca Bruno Latour em Sobre o culto moderno dos deuses fatiches: seguido de Iconoclash, lançado pela Editora Unesp. Nesta obra, que marca etapa fundamental do projeto do autor – realizar uma antropologia positiva das sociedades ocidentais – tem-se acesso a dois textos, que desafiam as noções “crença” e a de “crítica”. O primeiro é resultado de um longo estágio na clínica de etnopsiquiatria do Devereux Centre; já o segundo, a introdução ao catálogo da exposição “Iconoclash”, com curadoria do próprio Bruno Latour.
“O interessante dos modernos é que eles sonham com um termostato que jamais souberam regular. Se quiséssemos representar a antropologia desses homens, teríamos de decifrar a sua fábula, como propõe La Fontaine, e nos perguntar se por acaso não descobriram uma passagem secreta entre o fetichismo e o iconoclasmo”, escreve Latour. “Para investigar essa dupla contradição, proponho duas noções meio improvisadas: a de fatiche e a de iconoclash. O leitor me perdoará os neologismos, se tiver em mente que foram consequência de dois “terrenos” bastante particulares.”
Ao longo dos capítulos, Latour destrincha o termo fatiche (junção de fato e fetiche), demonstrando que é possível respeitar as ciências sem opor-se aos (aparentes) devaneios da subjetividade. Em seguida, com a noção de iconoclash, ele propõe que se suspenda a postura crítica para que seja possível estudar o seu impacto. Graças a essas costuras de conceitos, torna-se possível tomar como objeto de estudo dois dos principais recursos que os modernos utilizaram para se distinguir dos demais: a crítica da crença e a crença na crítica. O resultado? O mundo não está mais separado entre aqueles que se banham em ardentes ilusões e aqueles que conhecem apenas a fria razão.
“Assim composto, este livro não demanda do leitor senão a suspensão – provisória, sem dúvida nenhuma – dessas duas noções reflexas: a crítica da crença e a crença na crítica”, alerta o autor. “Esse foi o único modo que encontrei para concentrar nossa atenção na natureza exata dos seres saídos de nossas mãos e compreender em que sentido devemos admitir que somos ‘filhos das nossas obras’.”
Sobre o autor – Bruno Latour é diretor-adjunto e diretor científico da Sciences-Po, em Paris, onde desenvolveu o programa de Experimentação em Artes e Política (SPEAP, na sigla em francês), e professor da London School of Economics e da Harvard University.
De sua obra, a Editora Unesp publicou Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora (2ª edição, 2011), A esperança de Pandora – ensaios sobre a realidade dos estudos científicos (2017), Políticas da natureza – Como associar as ciências à democracia (2019), A fabricação do direito – um estudo de etnologia jurídica (2019) e Júbilo ou os tormentos do discurso religioso (2020).
Título: Sobre o culto moderno dos deuses fatiches: seguido de Iconoclash
Autor: Bruno Latour
Tradução: Sandra Moreira e Rachel Meneguello
Número de páginas: 162
Formato: 13,7 x 21 cm
Preço: R$ 45,00
ISBN: 978-65-5711-067-6